Era

Sentei-me longe do grupo, ouvindo a música e a contagem reiniciar.

 O relógio marcava meia hora a mais do que o último momento que eu havia o encarado. As palmas, fluíam junto com o ponteiro dos segundos, me deixando um pouco desconfortável. O relógio realmente estava sendo um inimigo.

 Tomei mais um gole d'água ajeitando a joelheira sobre o pano da meia gasta, puxando-a e suspirando pesado com a pontada insistente em meu joelho.
 Deixei o pequeno urso azul da garrafa sendo guarda costas daquele líquido tão importante, levantando-me com as mãos na cintura. Retribui o sorriso de uma amiga que agora se aproximava.

- Segundo grupo.- A voz era calma, assim como seus movimentos enquanto nos passava um pouco do seu conhecimento. Tudo parecia-lhe fácil.

 Posicionei meus pés o melhor que pude, estendi os dedos até o metal gelado o envolvendo com a palma e só então suspirei, arrumei minha postura e encarei um ponto fixo que não tinha nada de interessante, mas me mantinha protegida dos olhares curiosos ao redor.

 Um, dois, frapé de vant, 

 Me mantinha calma, segurando a postura cheia de confiança. Uma confiança que eu não tinha. Pelo menos não naquela intensidade.

Três, quatro, frapé derriere,

 Meu corpo recebeu a primeira descarga de insegurança, os olhos de quem sabia mais do que eu me observavam.

 Cinco, seis, duplo a la second,

 Sorri acompanhando a agilidade, esquecendo-me um pouco do que estava por vir.

 Sete, oito, plié, 

Respirei fundo empurrando os pés já doloridos no chão.

Pirueta en dehors.

 Impulso demais. Muita força, muito medo...

Não terminei o movimento, finalizando o giro de forma desengonçada e sem classe.

Reprovei-me com um resmungo pesado, continuando a sequência dessa vez toda ao contrário. Meu semblante a essa altura já não mostrava mais segurança.

 Aos tropeços finalizei o exercício. Despedi- me dos movimentos da forma mais graciosa possível, finalmente desviando o olhar daquele ponto. Afastei-me pouco da barra com a cabeça erguida, agarrando um de meus cotovelos com a mão. Estava acanhada por ter errado. Acanhada por não ter sido perfeito.

Não era suficiente afinal. Era?...

"- Ótimo."

O elogio pairou tranquilo até meus ouvidos. Concordei agradecendo. Sorrindo a tal gentileza.

Era.